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Em  toda  parte

Tô Nem Vendo

Fotografia: Daiana Almeida. Mercado Central de Fortaleza.

Os corredores do Mercado Central estão apinhados de gente. Dos boxes, mulheres e homens sorriem para os que passeiam por ali. Tentam atrair a atenção de quem passa, querendo vender tudo que é tipo de coisa típica do nosso Ceará: castanhas, bordados, redes, chapéus. Sotaques dos mais variados, vindos do norte e do sul, são ouvidos. Dá para pechinchar? Cheiros, cores, tudo se mistura ali, mas o ritmo é um só: o forró raiz e arretado do trio “Tô nem vendo”.

 

Só o nome já denuncia a molecagem cearense do grupo: nos vocais, está Vanda, deficiente visual que junto com outros dois irmãos, também cegos, entraram para a banda que já existia desde 1974. A alcunha bem humorada veio de ninguém menos que o expoente brega brasileiro, Falcão, parceiro de longa data dos irmãos. Eles inclusive já chegaram a compor o programa do comediante, reforçando os laços de amizade que os unem.

 

Era uma quarta-feira cinzenta em Fortaleza, atípica para o mês de junho. Nossa reportagem vagueava pelos arredores da Catedral Metropolitana, procurando personagens para o nosso especial, quando ouvimos o som animado que vinha do Mercado Central. Impossível não se contagiar com a alegria vinda daquele som. Quando chegamos à porta do Mercado, lá estava o trio a embalar as tantas pessoas que entravam e saiam do local.

 

Nós paramos e ficamos curtindo a música. Nesse meio tempo, visitantes passavam e olhavam aquele trio alegre e não deixavam de escapar um sorriso. Quem não iria sorrir com aquela cearensidade toda no ar?

 

Era hora da cantora dar uma pausa para não desgastar a voz. Chegamos mais perto e pedimos para conversar com o trio. Além de Vanda, estavam o senhor Fritz, no triângulo, e o senhor Manoel, na sanfona. Os dois homens eram mais tímidos e delegaram a conversa para Vanda. Ela era toda sorriso.

 

Vanda canta no grupo desde 2000, quando ingressou com os dois irmãos cegos. Na ocasião que conversamos, não era o trio original que nos recebia: Fritz e Manoel conseguiam enxergar. Além de cantar, a mulher também é responsável pela percussão do grupo e são dela as batidas contagiantes que enchem o ar do Mercado Central.

 

Questionada sobre quem a ensinou a tocar e ensinou seus irmãos, Vanda nem deixou a pergunta terminar: “Foi dom de Deus, no ouvir nós aprendemos”.

 

Irmandade

 

Além de se apresentar no mercado, o trio também participa de festas, canta em restaurantes. Completam a renda também com a venda de discos, cada um a R$ 5,00. Já são nove volumes do mais autêntico forró pé-de-serra e da melhor qualidade. “Vamos juntando um dinheirinho de uma apresentação aqui, outra ali e vamos levando a vida”.

 

Como era de se esperar, o grupo é mais requisitado nas festas juninas. O som do trio vai bem com o clima dos arraiás que tomam conta da cidade. Nada melhor que comer um pratinho de baião de dois com vatapá e paçoca, tomar aluá e quentão, petiscar bolos de milho e macaxeira e pé-de-moleque, ouvindo a voz cheia de alegria de Vanda.

 

Mesmo Fritz e Manoel não sendo irmãos de sangue de Vanda, o grupo se enxerga como uma irmandade e dá para notar isso na sintonia da execução das músicas. A voz e o tambor de Vanda casam bem com a sanfona de Manoel. E o que seria do forró do trio sem o triângulo de Fritz?

 

Dizem que o que os olhos não vêem, o coração não sente. Pelo que Vanda deixar transparecer em seu cantar, ela sente muita alegria em seu coração. Essa alegria se espalha no ar e contagia o nosso coração. O que a boca canta e os ouvidos ouvem, o coração sente muito bem.

Ouça o nosso talento

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Por Gustavo Castello

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